quinta-feira, 9 de janeiro de 2020

Escritor do mês de dezembro

Muitos parabéns ao vencedor do concurso de escrita do mês de dezembro!


Não Sei
Não sei, não sei nada sobre tudo, não sei sequer o porquê de não o saber, não sei porque alguma vez desenvolvi um pensamento, se sabia que no final saberia o mesmo que no princípio, ou seja, que nada sabia, e, no fundo, será que quero saber? Será que não saber significa não ver, ou será que não saber significa meramente que não existem barreiras para a realidade que se vê, pois esta não se encontra limitada por conhecimentos absolutos que não podemos negar? E será melhor nunca saber, deixar o mistério da verdade por desvendar, ou desvendá-lo, e roubar-lhe toda a sua beleza e magnificência? Eu não sei…
Eu não sei porque é tão mágica a noite, ainda que nela nada exista: apenas um vazio disforme e, ainda assim, a personificação de toda a beleza a que a Natureza sempre acostumou o ser humano, desde que este acordou para o mundo que o rodeia. Não sei porque serão as estrelas, tão distantes, tão frias, tão mortas, no céu negro, ainda assim, a luz que ilumina a vida, quando o resto está apagado, as chamas branca e débeis que restituem cor e expressividade ao mundo engolido pelas trevas, a esperança ígnea que faz o ser humano acreditar num melhor futuro, num sonho inevitavelmente impossível, e, no entanto, demasiado belo e perfeito, para não se tornar realidade. Não sei porque é a Lua atraída à Terra, girando infinitamente em sua volta, sem nunca lhe tocar, sem a abraçar ou beijar uma vez que seja, apesar de a constantemente encarar, sempre sorridente e resplandecente, como se as duas vivessem um amor proibido, condenado ao falhanço e ao cataclismo, mas não por isso desistissem da sua paixão mútua, transcendente a qualquer lógica ou raciocínio. Porque funciona assim a noite? E porque amo eu tanto que ela assim funcione? Eu não sei…
Eu não sei porque luta o ser humano consigo mesmo, porque está ele disposto a sacrificar tudo, em troca de nada, e depois, a não dispensar migalha que seja, nem que tal cure a fome em todo o mundo. Não sei porque veem os seus olhos as cores que tingem as peles dos seus iguais, e porque, ao verem-nas, tão variadas e vivas, como uma grande tela multicolorida, preferem apagar todos os tons que não reconhecem em si próprios. Não sei porque teme o ser humano as sombras, porque o assustam seres sem rosto, escondidos na escuridão, por muito pequenos ou inofensivos que sejam. A sua disformidade é a forma que mais aterroriza os sonhos do Homem. Não sei como pode o ser humano ver tão nitidamente a realidade em sua volta, como pode ele distinguir com tanta facilidade o bem do mal, como se a moralidade fosse uma qualquer radiação que apenas a sua visão capta, e, ainda assim, escolher ignorar o caminho correto, e deixar-se escorregar pelo desfiladeiro da tentação e do erro. Não sei porque é o ser humano o ser que é, e porque não é o ser que podia ser. Será que não o quer ser, ou será que não o consegue ser? Será que alguma vez existirá um ser que o seja, ou será que para sempre ele se manterá o ser que é? Eu não sei…
Eu não sei aquilo que poderei vir a ser, não sei sequer aquilo que sou agora. Não sei o que é a vida perfeita, nem sei sequer se tal coisa existe, fora dos desejos irrealistas que por vezes me assaltam. Não sei porque terei sido condenado a tal paradoxo existencial, no qual a minha mente, tão viva e criativa, morre, quando chega à minha língua, e os seus pensamentos com ela perecem, nunca chegando ao mundo exterior. Não sei porque me apaixona tanto a escrita, porque me parece tão mágico e curioso o mundo em que vivo, porque vejo nele algo que todos parecem ignorar, e que mesmo eu não saberia definir, porque não posso apenas absorver e aceitar a realidade em que fui posto, porque me sinto obrigado a interpretá-la sempre como se os meus olhos me mentissem, e eu visse apenas a necessidade de ver, realmente ver, ver aquilo que os outros não veem, ver a arte que eu sei existir, algures escondida, porque também em mim existe, porque existe em toda a gente, porque existe em tudo.
No fundo, eu não sei nada, não sei nada sobre tudo, não sei sequer porque penso, ou porque escrevo a minha ignorância, mas pelo menos sei que nada sei, como alguém muito sábio um dia disse, e mesmo que não saiba quem ele era, sei que ele estava certo, e, afinal, ainda bem que estava, pois a vida apenas tem significado se se buscar saber, e eu o farei, e espero que todos o façam, porque saber é ilusão, e não saber…bem, não saber é ter os olhos fechados, mas todos os olhos se podem abrir, como botões de belas flores, e aquilo que em frente deles se estenderá é aquilo que eles quiserem que seja, e a sua realidade é a realidade que eles compreendem, nada mais.
Jack Maquiavel - Escalão A

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